PARADOXO


Leia na íntegra a coluna de Bruna Sebastião.


Felipe Stefani
Por Bruna Sebastião

Ultimamente tenho sido um para-raios de conversas delicadas, porém necessárias. No entanto, a dificuldade de se tratar de assuntos delicados seja, talvez, a pouca intimidade e medo da incompreensão que posso ter com as pessoas. Afinal, nessa onda de conservadorismo e pensamentos como os da Idade Média eu imagino que qualquer deslize com as palavras sirva para causar um mal-entendido.

Em uma dessas ocorrências, fui colocada contra a parede sobre o uso de drogas e como isso é prejudicial à sociedade. A pessoa que me dirigia o questionamento não era alguém com a qual estou acostumada a debater esse tipo de assunto, e eu estava numa posição complicada para me expor. Quem me conhece e convive diariamente comigo sabe, pelo menos um pouco, como esse debate é recorrente e constante na minha vida. Desde que o mundo é mundo lidamos com o uso de substâncias que alteram nosso organismo seja pro uso recreativo, medicinal ou espiritual.

Essa prática não pode estar no meio das maiores civilizações e povos já encontrados por coincidência. Me pergunto quase sempre: qual foi o momento em que deram conta da descoberta da ayahuasca? Com que princípio se imaginou juntar uma raiz e uma folha específicas que sairia como resultado uma das mais potentes ferramentas para conhecer a si mesmo? E se conectar novamente com a mãe terra?  Reativar todas as coisas das quais fomos distanciados pelas civilização e tecnologia?

Claro e, com toda razão, vão me dizer que a ayahuasca tem uso religioso e não recreativo como as outras substâncias. A ayahuasca sim, é utilizada em um contexto ritualístico e com acompanhamento, mas o que impede as demais substâncias de serem utilizadas em ambientes induzidos e com intuito de se estabelecer um propósito para a trip é o preconceito e a demonização que tais substâncias sofrem.

Albert Hofmann, o cientista suíço sintetizador do LSD, em diversas entrevistas deixa claro que seu intuito ao criar o LSD não era o que acabou por se tornar. Sua vontade sempre foi a de auxiliar em estudos e testes que definitivamente trouxessem melhoria à vida humana.

Essa parte do debate é inegável. As melhorias e avanços que a descriminalização poderia oferecer são gritantes, mas, no entanto, a parcela da população que é apresentada a discussões sobre as melhorias é mínima, pois o debate começou há pouco a ser inserido em espaços onde se faz necessário, onde a população é oprimida e morta todos os dias. A informação querendo ou não está presa em uma bolha limitada e limitante. Se faz necessário que as pessoas com acesso ao conhecimento científico, possam usar desse lugar de privilégio para buscar uma mudança de paradigmas, levando esses debates para fora da bolha, buscando alcançar pessoas reais.

Foi nesse momento que me dei conta de como estamos fechados e cegos pela rotina e pela linguagem do meio em que estamos. A partir do momento em que fui questionada sobre o uso de drogas, fiquei confusa e sem palavras, porque não sabia falar para aquela pessoa na linguagem dela e não na minha, usar argumentos e fatos que fossem realmente penetrar na realidade dela e fazê-la visualizar dentro da sua própria realidade o quanto a proibição é manipulada e corrupta. E que não é para o bem de todos, mas sim, para o uso e benefício "deles", mais uma vez.

Esse pensamento não se trata somente de drogas ou proibição, mas sim de todo o nosso redor, até quando vamos continuar nos fechando para transmitir o mínimo que seja de conhecimento para as pessoas mais velhas, nossos pais e amigos, vizinhos, o tiozinho do ônibus, por não sabermos lidar com o mundo fora da matrix?

Saber é importante, mas transmitir também é.



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